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RÚBRICA: ESQUIZOFRENIA MUSICAL #4...por Pedro Moleiro | LEIA AQUI!

3/06/2019 às 00:00
Pedro Moleiro

Saudações esquizofrénicas!

Como têm gozado estes últimos dias de Primavera com sabor a Verão? Têm aproveitado os arraiais populares, para darem um pezinho de dança ao som daquela música popular de cariz maroto? Já comeram uma caracolada bem regada por umas imperais fresquinhas?

Infelizmente, a minha vida nos últimos dias não me proporcionou esses belos momentos de pândega e são convívio, fazendo com que o lançamento da quarta edição desta decorosa rubrica fosse adiado.

A vós, prezados leitores, o meu sincero pedido de desculpas.

Passado este momento de mea culpa, iremos ao que interessa: Música!

A semana passada, indo eu a conduzir tranquilamente e, como sempre, a respeitar todas as normas presentes no Código da Estrada, ouvi algo no auto-rádio que suscitou a minha atenção. Estavam a transmitir um mini-documentário sobre um marco na música feita no virar do milénio, bem como, de uma das minhas primeiras memórias auditivas: o 20.º aniversário do álbum «Play» de Moby. Como é obvio, não estava a ouvir a grandiosa Antena Livre. Todavia, não irei aqui revelar a outra estação de «serviço público» onde a minha telefonia estava sintonizada.

O mini-documentário intercalava quatro canções de «Play» («Honey», «Natural Blues», «Porcelain» e «Why Does My Heart Feel So Bad?») com a descrição dos factos e acontecimentos ocorridos nesse longínquo Maio de 1999, com especial enfoque no processo de produção e divulgação do álbum. O minucioso texto era da Isilda Sanches e contava com a possante locução do Nuno Reis.

A minha atenção estava repartida entre piscas, sinais de trânsito, cedências de passagem e as recordações que pairavam na minha cabeça. De todas, destaco as músicas «Porcelain» e «Why Does My Heart Feel So Bad?». A primeira, porque era a banda sonora que vigorava no anúncio do filme «A Praia», protagonizado pelo Leonardo DiCaprio, que passava, sistematicamente, tarde e a más horas, na TVI e que me excitava uma curiosidade imensa por este ser uma «película com bolinha». Já a segunda, remonta-me para uma altura em que, a maioria de nós, eramos inocentemente felizes sem o sabermos: a infância. Algures no ano 2000, eu assistia inúmeras vezes, sempre com aquele cândido entusiamo infantil, ao seu teledisco no mítico programa «Top +». Adorava-o, porque era diferente da maioria dos que via na velhinha televisão da minha avó. Era todo em desenhos animados!

Se, porventura, tu que estás aí, és mais novo do que eu, pertences à Geração Z e estás a ler esta «lamechice» com um ar jocoso. Gostaria de te dizer que se viviam outros tempos.

Naquela altura, a Internet era algo incipiente e residual. A maioria da população portuguesa não tinha computador em casa. O acesso à World Wide Web era feito pela ruidosa ligação telefónica 56 kbps e, sempre que tentava entrar no Internet Explorer, no saudoso Windows 98 SE da minha mãe, o telefone ficava impedido e o valor da conta, ainda em escudos, disparava. Ainda se armazenavam muitos ficheiros em disquetes. Os telemóveis eram absurdamente caros e pesados, servindo só para fazer chamadas e trocar mensagens. Ter mais opções que os históricos quatro canais de televisão (RTP1, RTP2, SIC e TVI) era um luxo, ao dispor de uma pequena minoria. Só se conseguia gravar emissões em VHS e a ideia de usar uma caixa para recuperar programas passados nos últimos 7 dias, era uma autêntica ficção científica, que nem os agentes Dana Scully e Fox Mulder conseguiriam acreditar… Até o meu Sporting era campeão!

São tempos “longínquos” em que não se sabia a melancólica estória por detrás da música e do seu teledisco. Também estava longe de imaginar que «Why Does My Heart Feel So Bad?» se tornaria uma das músicas predilectas para os meus momentos de neura.

Enfim! Tantos caracteres gastos e ainda não falei nada de jeito!

Entre as inúmeras informações que o Nuno Reis ia contando no decorrer deste mini-documentário radiofónico, há uma que destaco pela sua particularidade.

Após uma incursão falhada de Moby pelas sonoridades mais cruas do Punk (em que destaco a sua versão de «That's When I Reach For My Revolver» dos Mission of Burma), «Play» estava fadado a ser o seu último trabalho discográfico. As vendas não eram satisfatórias, as suas músicas não estavam presentes nas playlists das rádios, o próprio artista tinha o desejo de ir estudar arquitectura e acreditava que muitas das faixas não cumpriam os mínimos olímpicos para serem grandes canções. Moby tivera para prescindir dos temas «Porcelain» e «Natural Blues», colocando-os pouco tempo antes da edição do disco e chegara a dizer que «Why Does My Heart Feel So Bad?» «era uma má canção techno».

Mas, algo fez com que a carreira de Moby desse uma volta de 180 º!

Condenado a ser um flop, a equipa de promoção delineou uma estratégia, à época, inovadora e arrojada. Sem quererem ver o seu árduo trabalho desperdiçado e, após a falta de apoio por parte das rádios, a editora aceitou que as suas canções fossem licenciadas para filmes, séries e publicidade.

Com uma penetração enorme nos ouvidos do grande público, as rádios e a MTV (sim, a MTV passava música) acabaram por se render a «Play», aumentando ainda mais a sua notoriedade e tornando-o num recordista de vendas no defeso de 1999/2000.

Sei que gostos não se discutem e que, provavelmente, os artistas que invoco aqui não são do vosso inteiro agrado. Contudo, quem diz que não aprendemos e nos divertimos na nossa rotina, está bem enganado. Para mim rádio tem de ser isto. Não um mero depósito de músicas a metro, com interrupções para extensos espaços publicitários e umas banais intervenções dos animadores.

Costuma-se dizer que «o saber não ocupa lugar». Este mini-documentário, com cerca de 18 minutos, para além de me ter abstraído dos problemas do meu quotidiano, acrescentou-me algo. Fez com que eu, após terminar a minha viagem, continuasse de ouvido colado ao que o Nuno Reis tinha para me contar.

Por fim, não posso perder esta oportunidade para dizer que, apesar de não ter ouvido isto na Antena Livre, a rádio abrantina faz um autêntico serviço público, sem receber qualquer verba do Estado, não fazendo jus ao que referi anteriormente, tendo programas e rubricas (não esta) que nos tornam um bocadinho mais ricos.

Até ao próximo texto! ????

 

PEDRO MOLEIRO

Segundo a Sociedade Russa de Psicologia, a Esquizofrenia é uma doença mental endógena progressiva, caracterizada pela dissociação entre a realidade e o ilusório, caracterizando-se através de delírios, alucinações auditivas e perturbações formais do pensamento.

Mas o que é que uma rubrica sobre música pode ter a ver com essa madrasta patologia!? – deve ser o que estais a pensar!

Vão ver que vai fazer sentido após lerem as seguintes palavras.

A minha relação entre a música e a rádio é quase umbilical.

Longe vão os tempos em que, bastante petiz, ouvia religiosamente com a minha avó, a saudosa Rádio Tágide (96.7 FM Estéreo – A sua rádio, a sua rádio…). Aí, entre programas míticos como o «677 – Linha Livre» (Discos Pedidos) e os históricos anúncios como «Tipografia Água d’Ouro», «Hora Louis Lacroix», «Restaurante “O Barraqueiro”» e «Móveis André no Pego» - cujas bases sonoras iam desde do Eurodance em «Better Of Alone» de Alice DeeJay, à loucura em «Wuthering Heights» de Kate Bush, passando pelo pimba magôto (como diria o cronista João Miguel Tavares) de Quim Barreiros nos versos «Ai que cheirinho que vem da cozinha…» e acabando nos cantares populares do Rancho Folclórico da Casa do Povo do Pego.

Lembro-me, com muita ternura, a vez em que falei, em directo, com Lurdes Gonçalves para pedir o tema «Parabéns (Hoje é o teu dia)» do Batatoon. Na altura, algures em Novembro de 2001, estava a celebrar o meu sétimo aniversário. Era o Spotify da época…

Mas as minhas influências radiofónicas não se ficam pela Tágide.

Durante anos, o auto-rádio da minha mãe alternava entre o Jogo da Mala da Emissora Católica Portuguesa e o Programa da Manhã da Rádio Comercial – A Rádio Rock (pagava para tê-la de volta), onde Nuno Markl, Pedro Ribeiro e Maria de Vasconcelos animavam as manhãs, sempre com a melhor música.

Dizem que os anos iniciais moldam a vida de um ser humano pois, alterno entre as malhas mais rockeiras e os clássicos mais gloriosos da nossa música.
Aí já se nota alguns traços da patologia anteriormente descrita. Obrigado mãe! =D

De seguida, já a entrar na puberdade, passei por aquela febre de ouvir, sistematicamente, a Cidade FM. Apesar de hoje em dia não me rever naquele estilo, posso dizer que aquela fase não me fez mal nenhum. A estação era bem mais ecléctica do que é hoje, tendo como referências Pedro Marques, Elsa Teixeira, a Verinha Mágica (sim, a Vera Fernandes da Comercial), Miguel Simões, Wilson Honrado ou Joana Azevedo, aos quais agradeço os conhecimentos de Hip-Hop, R&B, Nu Metal e Música de Dança que batia na altura.

Por fim, pouco antes de rumar a lides universitárias, voltei ao meu universo rockeiro que deixara para trás muito petiz, muito por influências dos meus colegas e amigos de secundário. Longas tardes, entre as primeiras cervejas e algumas travessuras, tivemos a ouvir e debater Nirvana, Pearl Jam, SOAD, Foo Fighters, Linkin Park, Evanescense, Soundgarden, Guns N’ Roses, Blind Zero, Faith No More, Oasis, Blur, Alice in Chains, Iron Maiden, Moonspell, Tarantula, Pink Floyd, Godsmack, Limp Bizkit, Slikpnot, entre outras bandas. Éramos um bando de putos parvos e borbulhentos, desfasados do mainstream que vigorava na altura. E felizmente, ainda o sou!

Foi por essa altura que me tornei um fan boy da Antena 3, numa fase em que ainda era «a rádio da primeira vez» e onde conheci os meus gurus da música e comunicação, entre os quais, Fernando Alvim, Ana Galvão, Mónica Mendes, Diogo Beja, Álvaro Costa, Henrique Amaro, Nuno Calado, Luís Oliveira, Pedro Costa, Joana Marques, Raquel Bulha e, mais tarde, Tiago Ribeiro, Inês Lopes Gonçalves e Daniel Belo.

Com eles aprendi que se pode falar de assuntos sérios, de música ou de algumas trivialidades, sem usar aquele tom sério e carrancudo, mas também sem se cair na estupidez de tratar o seu auditório com expressões bacocas como «Como é que é, meu puto!». Sobretudo, tiraram-me do tédio muitas das vezes e enriqueceram-me culturalmente. Com eles aprendi que há muito mais mundo para lá do que é comumente audível e que, como diria o lobo António Sérgio, tem que haver o «direito à diferença».

Por fim, todas estas condicionantes patológicas aprimoraram-se quando fui estudar para uma «Nova Lisboa» multicultural, onde em 4 anos, passou de uma capital semi-deserta, para um dos principais centros turísticos da Europa, onde convivi com gente com muito mais mundo, de várias latitudes e com outras perspectivas de vida…

Com tudo isto, ainda não estão convencidos da minha patologia?

 

 

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